segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Sonhos antigos e a doce surpresa atual

Não cabe aqui descrever a história do psy-trance, mas basta dizer que essa música dionisíaca, embriagante cessou de oferecer subsídios existenciais aos jovens. A união com o Todo, ou desiludiu essas pessoas, ou tal união não passa de falácia. Em ambos os casos, a troca da experiência pagã por uma ética espiritualista, um paganismo altruísta e voltado ao outro e à supressão de preconceitos indica uma crise entre esses jovens. Uma crise existencial profunda, que tentam suprimir através dessa ética nova no espírito trance.


Agora, basta lembrarmos que tal crise não se contenta, não se suprime por essa ética. Pelo contrário, ela existe apenas como paliativo ou caminho para a uma tomada de consciência perante o abissal mundo de mentiras, apoteose de imbecilidades e deslumbramentos vazios, crises éticas e religiosas, descrença e fatalismo, mas principalmente, é um espírito crítico, inimigo do conformismo, e inimigo ainda mais feroz dos valores neocapitalistas.


Um último ponto a ser considerado é a completa inconformidade como o que há de fatalista, fraco, imundo, corrupto no mundo dito guardião dos valores enaltecedores e virtuosos. Dito de outra forma, essa sociedade está cavando sua própria cova. A revolução desses jovens em níveis filosóficos será de natureza histórico-crítica, e lógico-metafísica pela sua espiritualidade; trata-se de um despertar da consciência crítica sem ideologias. Trata-se, portanto, de uma revolução social, de uma completa e integral revisão e reestruturação das relações humanas, de avaliação dos saberes, valorização da racionalidade perdida para o consumismo bestificante, destruição de valores antigos, recuperação da abstração face à inutilidade do pensamento existencialista frente a um conhecimento que parte do ser, mas é transcendete a ele, não filosofia como arte, mas a busca da verdade como filosofia, razão como busca da plenitude do conhecer.


Termino aqui revelando que tenho grandes esperanças nessa revolução que vem crescendo, uma mudança por dentro, não fuga, por isso mesmo, nada a ver com o fracasso hippie. É também algo sério, politizado e se trava na busca constante do conhecer. Espero que essa revolução não tenha me enganado em profundidade, e, o que desconheço de suas futuras consequências, anseio por conhecer, por ver e sentir. Meu tempo já passou, parece, em participar ativamente desse espírito, mas pretendo ajudar indiretamente, mesmo com minhas orações. O mundo como está não pode ficar...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Considerações sobre a nova ética jovem

É preciso voltar à metafísica de artista por um momento. Recentemente tive provas de uma espiritualidade centrada nas raves, um tipo de manifestação jovem de amor à música eletrônica, como uma forma de unir as pessoas por essa música. Decidem também por uma consciência crítica da realidade, uma intelectualidade viva, não relativizante ou indiferentista, mas livre de ideologias e preconceitos, baseada mais na análise da realidade (seja pelo método marxista puro, seja pelo gramscianismo, mas muito mais seguindo não-oficialmente a escola de Frankfurt). Existem contradições enormes aí.


1-A metafísica de artista não pode existir nessa resposta espiritual, porque tanto o apolíneo é um resultado da moral dita 'nobre' dos aristocratas quanto o dionisíaco é pura embriaguez, hedonismo imoral.


2-Se o novo espírito ravista opta por uma união social, uma identificação entre esses jovens, significa que o hedonismo falhou como uma forma de se chegar ao Uno, falha nem é tanto a relação entre a metafísica de artista e a ontologia dos baladeiros, mas é muito mais deficiente que se chegue a qualquer compreensão de qualquer princípio motor da realidade por essa via. Vê-se o hedonismo como pura estupidez, um exagero dos anseios adolescentes, um querer superficial de prazer, de sentir esse prazer. Embora não haja moral propriamente dita, a nova ética formula uma filosofia espiritualista, portanto, dualista, e distante do caos pagão, embora deveras longe da identificação do monoteísmo. Ainda assim, a dualidade abre um caminho para uma possível identificação...


3-A opção pelo marxismo, seja que corrente for, é pela análise da realidade, é uma opção pela hermenêutica filosófica, um voltar a uma forma materialista de se ver o mundo pelo simples motivo pragmático de adquirir uma espírito histórico-crítico. Mas a dualidade, a espiritualidade, quebra a ideologia, consegue uma originalíssima contra-ideologia e se questiona a si mesma, quase com rigor científico. A dialética é aceita, e com ressalvas, mas o materialismo é rejeitado, ainda que não totalmente. Transita-se dialeticamente entre o Hegel e Marx, mas muito liberalmente. O ponto central, o único critério, é a desmistificação da manipulação psicológica e mental do capitalismo moderno, dessa sociedade robotizada e escravizante, seja pela moda, costumes, moral consumista, seja pelo desprezo a tudo que não é industrializado, esteticamente concebido como ideal.


4-Se há uma ética, não há hedonismo puro. Há equilíbrio entre o idealismo e o materialismo. Tudo, nessa nova visão, é, então, equilíbrio. Isso por si só a aproxima muito do new age astrológico, até do ocultismo, mas não se confina a isso. É um despertar racional de uma pequena parcela de jovens contra a ilusão que o embate de ideologias criou, contra o fanatismo socialista e, principalmente, contra a mentira global da globalização, do capitalismo global.




O que merece melhor detalhamento é o que motivou essa tomada de posição, o que essa visão combate já foi discutido no post anterior e um pouco nesse, e a origem do trance...

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Realidade metafísica

No fundo, sabemos que essas considerações metafísicas são tão vazias de sentido quanto de  conteúdo pessoal, de afirmação da minha liberdade criativa. São de uma qualidade risível, cheia de preconceitos, críticas vorazes contra si mesma, acaba por se autodestruir. É um círculo vicioso de imposição, crítica e reparos de incongruências, reparos que já são novas imposições.



É também uma tentativa desesperada de contornar uma situação triste e fria, uma tomada de partido em uma guerra de instintos indeléveis, uma constante briga pelo poder, conflito entre a moral velha e retrógrada, o sentimento burguês-velho, a religiosidade decadente contra a idiossincracia dos novos meios de comunicação, a ditadura da moda esdrúxula, a estética morta de sentido e de simbolismo, o impressionismo comido e mijado, a estupidez e mesquinharia dos novos burgueses, criaturas ignóbeis e parasitas, sedentos por poder, à procura de carne fresca para se alimentar, exploradores das mentes dos novos operários, escravos dos próprios sonhos e projetos, suicidas contumazes, assassinos de seu corpo e de sua mente, chafurdando, como os porcos que são, em suas faculdades que ensinam a manipular sonhos de outras criaturas suínas, sentindo-se orgulhosos de seu papel no 'mercado de trabalho'.



A falsidade desse impulso em estabelecer juízos de valor, explicações racionais para a irracionalidade desses animais imundos que se afogam em bebidas alcoólicas, entorpecentes, amostras primitivas de selvageria e brutalidade constantes, a incapacidade de viver em sociedade, o amor ao nada, a falta de perspectivas, tudo isso, motivou as últimas postagens também. Mas para que se saiba minha visão sobre a realidade, sem achismos e obscurantismos, sem deturpações de veracidade histórica, é bom firmar o pé aqui e gritar pela derrubada da estupidez!!!



Abaixo a idiotice, os palhaços consumistas, a falta de noção, o desespero pelo inferno barato e prostituto que se chama vida!!!

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Existencialismo informal hodierno

O medo da vida, pavor do desconhecido, do impenetrável pela luz da razão, a aversão sentida pelo homem pela dor, sofrimento e desespero existentes em todos os níveis de força, intensidade, e o desejo de prolongar a sua existência não pelo desejo da imortalidade, mas pelo imortalizar-se artisticamente, sendo a arte o dissipar do ser em inúmeras representações da realidade, são os motores do culto, da religião e da moral. Se pudermos dizer que a moral antiga, pré-homérica é uma coisa impossível, caótica, diga-se que a moral grega é algo ainda mais impossível para nós, por ser mais profunda, dotada de sentimentos mais liberadores de instintos em matizes estéticas e filosóficas (sim, filosofia como auto-realização, verdade é o Eu mais pleno, minha busca, minha verdade), que os puros impulsos hedonistas ou mesmo o ethos tribal dos povos primitivos, pagãos europeus, pré-cristãos. Para o homem contemporâneo é difícil entender o mais puro barbarismo, a despreocupação com o Ideal de pureza, quanto mais as profundas aspirações do grego de se imortalizar para além da história, mas dentro do mundo e não fora dele, em direção ao Nada, como o cristão afirma.



Se existia uma moral entre esses povos era mais uma moral pessoal, uma superstição de se entender pessoalmente com as divindades e os cultos eram muito mais um apelo, uma lamúria por petições e boas colheitas que o pedir perdão por ofensas da comunidade contra outras comunidades (isso é guerra, nada má em si), de pessoa contra pessoa (a lei tribal determinaria uma punição, o que é algo muito mais racional que o nosso romantismo cristão estúpido), de pessoas e comunidades contra os deuses (aqui temos sacrifícios a serem aceitos, dependendo da gravidade da ofensa). Como se vê, é uma ética pragmática, séria e sóbria. Mas em certo sentido, temos nos aproximado cada vez mais da moral pagã, não a metafísica grega antiga, mas a moral mais indiferentista e saudável que pode haver. Isso se deve aos exageros e fanatismos pregados pelas religiões monoteístas, suas violências psicológicas, a renúncia ao que só leva á morte, ao sofrimento, como o ascetismo, jejum, longas orações, e privação de prazeres, principalmente o sexual. Mas a questão moral parece ainda mais forte hoje, não se interessa mais pelo mais desinteressado e bondoso ato se não estiver acompanhado de prazer, realização.


Como a sociedade ocidental aliviou esse instinto, esse sentimento de carência perante a vida? Como já sabemos, o idealismo cristão deu lugar ao humanismo, ainda idealista, e, depois, o mundo virou palco de conflitos ideológicos amargurados e o que houve depois? Um renascimento do prazer consumista, a sexualidade banalizada pelo senso comercial, a ‘aburguesização’ de toda a realidade, a idolatria da fama televisiva, o fenômeno cultural chamado ‘pop’ nascido da Terceira Revolução Industrial. O vazio se alarga...


Desejo de espiritualidade? O interesse renovado do ocidental pelo budismo e até por outras formas de religião renovadas, ou pelos movimentos neopagãos não é puro new age, nem vazio espiritual ou mesmo consciência ecológica viva. Trata-se tanto de um despertar do ocultismo, disfarçado de new age, quanto de um reinteresse pela história, perdido no século XX graças à luta de ideologias, e paixão pelo que a história esqueceu, a história do belo e insondável paganismo e seus mistérios. Mas é principalmente um despertar dos instintos mais íntimos e poderosos do ser humano que se usa dessas máscaras conceituais e históricas para se reafirmar como senhor do homem, do novo homem. Talvez seja apenas um romantismo barato, mas essa nova apreciação da imoralidade nos dias contemporâneos não parece um fenômeno passageiro.


Falando aqui em outros termos, pode-se ver como esse instinto renascido se manifesta na execução de crimes mais bárbaros, aumento de doenças mentais, distúrbios psicológicos, e mesmo renovações nos setores mais atrasados, idealistas e aprisionantes como o é a Igreja, agora revitalizada pela Renovação Carismática. E não pára por aí, a própria moral dos códigos jurídicos, das constituições modernas, ainda que sofrendo influência do obscurantismo religioso, especialmente romano, está mais ligado a uma perfeição, um sonho romântico de perfeição que almejam que o Estado laico atinja. Laico e com suas próprias leis? Como? Falamos de moral primitiva? Não, essa foi há muito esquecida. Falamos de um novo otimismo da ética laica, impulsionada pela nova visão de ética individualista e social, apenas no sentido em que é utilizada e praticada nas grandes corporações.


No fundo, o instinto primevo aí se encontra e a busca por ele é também impulsionada por essa ética laica, esse otimismo que garante aos homens a liberdade de a tudo conhecer, a tudo fazer, a tudo ser, e, principalmente, a tudo ter. Essa falsa plenitude prometida pelo capitalismo é um tiro no pé, no pé capitalista e no pé comunista. As críticas da esquerda produzem efeito contrário ao desejado, essa ética torna-se ainda mais querida e, por ela, inicia-se o processo de desintegração da civilização e o início de uma nova ordem humana: a ordem do instinto, do querer, não do querer possuir, mas do simples querer, a onipotência da vontade.


A metempsicose do avesso se realiza e o animal-homem se torna deus ao se afirmar e buscar ser cada vez mais animal...


A arte e o ornamental da nova juventude pagã

Impossível é apesar das semelhanças e do rigor do compromisso com uma noção quase metafísica da libidinagem, para o jovem dissociar o apolíneo e o dionisíaco da classificação de instintos estéticos, isto é, ligados ao íntimo do ser, mas totalmente distantes de qualquer necessidade espiritual, física e religiosa (embora estas existam como ‘acidentes’). A visão estética do mundo já se dissocia de considerações sobre a moda contemporânea e de qualquer idealismo vazio, se integra, na verdade, ao próprio culto festivo, seja pela falta de senso crítico e juízos racionais sobre esses arrastar-se pela loucura dionisíaca, a embriaguez sentida e levada ao êxtase máximo. Da mesma forma, o apolíneo é simples cristalizar do êxtase de Dioniso em formas mais racionais, formas mais práticas, visíveis. Falando artisticamente...



Qual a importância da arte plástica? O apolíneo aqui se manifesta em uma ilusão, a apreciação proferida falsamente, e inconscientes dessa falsidade, a apreciação falsa do prazer em si, do beber em si, da paquera em si, do tocar, beijar, dançar em si. A dança é tão dionisíaca, isto é, pagã, quanto a música, por estar diretamente ligada a ela como é a voz ligada à fala. Para uma pura contemplação musical é exigido silêncio para concentração, o entregar-se ao espírito da música, mas a dança não é mera quebra dessa corrente, ou mera representação desse espírito, mas é total e essencialmente Unidade realizada fisicamente na mesma medida em que é realizada espiritualmente. Então, mesmo os tímidos, ao serem tomados pelo espírito, estão unos, ainda que imperfeitamente, só em espírito, ao Uno Primordial.


Dança é tanto apolínea quanto dionisíaca ou, para sermos mais comedidos, é o elo mais forte de ligação entre o apolíneo e o dionisíaco, ou ainda é a arte apolínea mais consonante aos instintos pagãos mais puros. Veja-se aqui a condenação do papa Bento XVI às liturgias modernas concernentes ao uso da dança nas missas como algo dissonante da pureza, do equilíbrio. E, de fato, muito mais eficiente que o ecstasy e a vodka é a dança para se chegar ao mesmo êxtase, talvez ainda mais profundo e poderoso; essa União atingida pelo desenvolver do corpo se inicia com o extasiamento mental estimulado por drogas ou pela dança, a dança é mais forte por exigir mais, mais impulsos instintivos, mais vontade por parte dos iniciados. A dança era também usada para o mesmo fim em celebrações pagãs antigas, e nas neopagãs também.


Os outros elementos participantes do apolíneo são acessórios para a entrada no dionisíaco, mas muito mais máscaras a esconder o instinto pagão, são tanto os elementos do culto quanto os da pura festa e, na verdade, não precisa haver separação entre elas, como não deve haver entre iniciados e não-iniciados, e de fato não há. Existem outros recursos apolíneos, intencionais para o desenvolvimento dos instintos, sejam perfumes, roupas, acessórios, maquiagem e mesmo outras pessoas utilizadas para esse mesmo fim. Se eles impulsionam o instinto é algo muito subjetivo, tanto do atiçador quanto do alvo, mas que são atalhos certeiros para se atingir o Uno e também máscaras para esconder o dionisíaco e a própria música, isto é inquestionável.


A música como verdadeira luz, fundamento da realidade, forma pura de se conceber o Todo e até mesmo sua origem e fim? Não sendo apto para levar o assunto por tais veredas, recomendo a leitura do Livro I de “O Mundo como Vontade e Representação” de Arthur Schopenhauer. No que concerne à união com o Uno, se o apolíneo tem sua ‘forma’ nos recursos estéticos, a ‘forma’ do dionisíaco não é a música, mas sua essência. Da mesma forma que a canção, a letra da música é sim sua forma, mera forma que funciona tanto como máscara quanto como atalho, e devemos nos questionar aqui sobre a validade da ‘letra’ frente à ‘melodia’. Não cabe mais defender a exclusão da primeira em preferência da segunda, por razões práticas e mesmo metafísicas. Se pudermos ver o dionisíaco como o verdadeiro incorpóreo, fundamento do caos e, portanto, da existência, veremos que a ‘letra’ é apolínea na verdade, pertence ao sonho e não à embriaguez, é máscara e atalho para o Uno. Eliminar esse apolíneo seria tão estranho como é impensável fazer todos os jovens irem pelados às raves, não importando o que se faz ou se pensa ali durante o êxtase. Não é só a moral que os impede de atingir o Uno, visto que a moral pagã é liberal assim, mas a ausência do apolíneo, do engano, da sombra, da máscara, do sonho os deixa perdidos para o estado de embriaguez.


Dito de outra forma, não há embriaguez se não houver bebida...


quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O apolíneo e o dionisíaco no hedonismo atual

Analisando os ditos hedonismos contemporâneos, seja as baladas irresponsáveis, os bailes imorais ou, principalmente, as raves, antros de perversão sexual e moral, dependendo da ânsia de seus participantes em impor a si mesmos uma busca constante pelo desprendimento do mundo, podem se tornar objetos interessantes de estudo, não somente para fins sociológicos, mas também, religiosos, morais e, por que não?, estéticos.



Diga-se de passagem: os mesmos problemas, simultâneos ou não, em maior ou menor grau, que podem estar influenciando ou serem os motivos principais da depravação dos pré-adolescentes podem ser os motores do que chamo espírito baladeiro dos adolescentes, jovens e de muitos adultos também (estes, seja pelo desejo da continuidade da juventude, seja pela fidelidade aos tempos de solteiro, sendo casados ou não ou mesmo por uma estranha integração ao mundo de seus filhos, sobrinhos, netos etc). Mas é um exagero afirmar que não se pronuncia aí uma tendência mais séria e comprometida como uma legitimação da imoralidade mais doce que existiu.


É o que chamamos de fenômeno new age o renascimento das religiões pagãs e do interesse pela cultura dos povos pré-cristãos (principalmente tribos européias) e esse crescimento tem se mantido cada vez mais distante dos movimentos esotéricos sérios assim como da astrologia mais liberal. É um crescer muito mais aberto e dinâmico, mais estrito em esferas particulares de cultura, dependendo do paganismo, se é nórdico (asatrú), celta (druidismo), norte-americano (xamanismo).


Uma das características mais marcantes e que mais se desenvolvem dentro desses movimentos não é um empurrão da cultura pop, visto que esta frequentemente cria falsas figuras relacionadas ao paganismo, falsos conceitos e interpretações e exageros afins. A fonte dos neopagãos parece ser a da pesquisa histórica, que visa resgatar a verdade espiritual e cultural desses povos antigos, e, entre as mais populares facetas dos cultos, está o êxtase sexual, o sagrado feminino e a moral pagã de revalorização dos instintos e de uma ética pragmática, sem consolos metafísicos e estruturas dogmáticas rígidas, com exceção do asatrú que parece ser mais purista e tradicional em seus cultos. A wicca é mais ocultista que pagã, uma anomalia, ressurreição do que nunca existiu, produto tanto de fantasias new age quanto de exageros das antigas ordens pseudopagãs, mesodruídicas, que procuravam resgatar esse sentimento em seus mistérios. Coisa de século XIX.


Nosso objetivo aqui é tratar de moral. Pois bem: a sacralização do sexo está estritamente ligada ao movimento ecológico, o que atrai tanto jovens militantes quanto os descompromissados, tanto viciados em sexo quanto idealistas, e mistos dessas categorias e de outras. Nessa miscelânea, o ponto comum nem são seus deuses, meros arquétipos de sua própria busca, seu eu sacralizado na natureza, verdadeira e única senhora do mundo e do destino. Aqui pouco importa teologia ou dogmas ou livros, culto, o que importa é o encontro com os deuses através do alcance do Eu. Através da plenitude da vida, a fonte máxima do prazer e do êxtase, o sexo...


Por isso, os tímidos, novatos, não são discriminados, pois esse é um culto profundamente pessoal e comunitário, social e religioso, mais interessados em evoluir seus adeptos que angariar novos. Então os novos, como os velhos, tímidos e atirados, têm um treinamento, uma proposta de luta contra a moral aprisionante, contra a cultura hipócrita do pós-moderno. Lutam e se integram ao grupo, integrando-se a si mesmos.


Essa plenitude é atingida através do cultivo do espírito infantil, do desprendimento de sentimentos e emoções que me bloqueiam, me fecham ao prazer, através do amor às coisas belas, de uma transmutação de todos os valores, o amor pelo orgulho, pela arrogância, pelo que me afirma como ser livre e amante do belo e do bom. Não existem Ideias puras, e sim minhas idéias, minhas purezas, eu sou a base do meu mundo, o centro do Universo. Não se pode confundir aqui essa afirmação do eu com ética individualista, visto que o grupo é também valorizado, mas ainda assim esse florescer para o novo é puro processo de autoconhecimento, de avaliação do que me prende. Esse ‘sonho’, essa fantasia infantil, essa mutação moral é pura afirmação da minha individuação diante do caos que a tudo governa. Não há unidade senão pela ética de honra e virtude aristocrática que impera entre os iniciados, e pelas atitudes e valores elevados que os levam a ter vidas plenas e levar vida para o exterior do culto, não moral ou mensagem, mas vida simplesmente. Afirma-se aqui a vida pura e ela nos leva a uma plenitude ainda imperfeita, visto que a individuação nos livra do sofrimento, da ilusão igualitária, da moral estúpida, nos eleva para acima do mundo e do próprio homem, pura inspiração e movimento apolíneo de máscara do caos de energias conflitantes que estão no cerne do homem, mas ainda assim sofremos visto que nossos instintos são incapazes, assim como nossa razão, de nos unir com o Uno, o Perfeito, o Caos. A união ética, social e religiosa não pode nos fazer atingir essa unidade, apenas indica união de pensamentos e sentimentos.


O Uno, o Caos só é atingido pela identificação dos participantes do culto com o que há de igual neles. Dioniso. Mas apesar da identificação de pensamento, de fé, tudo isso é pura individuação, puro apolíneo, visto que a união social é simples paliativo das dores que o devir nos causa, e que os deuses, a cosmologia, a nova ética é implantação do meu ser em todas as esferas do mundo, é uma criação de mundo, fenômeno artístico total. A arte é o viver e o que se chama de arte não passa de uma das facetas desse eu que se coloca como medida de tudo. O que há de igual, de uno em nossas almas? A loucura, a ausência de razão, a entrega total aos instintos, o virar animal, selvagem que se enche tanto de si que encontra o seu verdadeiro eu na quebra do seu ego, não a quebra opressiva e doentia que a moral cristã, judaica, islâmica ou budista prega mas em um esquecimento de tudo que vivi, irracionalidade frente às conseqüências dos atos, impensamento, puro sentir do corpo, vibrar do prazer na alma e nas sensações, êxtase dos sentidos.


Seja pela bebida, pelas drogas, pelo sexo ou por dois desses elementos ou por todos eles juntos, o êxtase vêm, ou se aproxima dele, da plenitude, que não é Ordem, mas é Caos. Logo, não se trata, pelo menos não profundamente, de se utilizar da imoral e culto pagão para legitimar pura libidinagem e depravação, pois estas têm um objetivo: o de me tornar o menos preocupado possível com objetivos, buscas, anseios. Se é humano esse buscar, esse desejo da busca, eu aniquilo unicamente esse desejo pela intensificação de todos os outros, pelo impulso de vida que sinto, que vejo crescer, e, assim, sem desejos, busco o estado de perversão da mente, de destruição do meu eu e atinjo assim o Uno, não pela abnegação dos meus desejos mas pelo esgotamento deles, pela satisfação de todos eles. Com o apolíneo, eu divinizo todo o meu Eu, torno-me deus. Com o dionisíaco, os deuses se tornam parte do Uno, se tornam uma única entidade e todo o mundo faz parte de suas almas e corpos e eles do mundo. Transcendência do corpo e imanência da alma.


Tempos de enterrar a velha moral... de uma vez por todas.


Considerações introdutórias sobre sexualidade extramoral

Uma nova preocupação me atingiu hoje: esperando poder comparar os novos impulsos hedonistas com as manifestações dionisíacas, sou obrigado a me desviar da proposta inicial por um momento e tecer comentários bem mais marxistas sobre a cultura contemporânea.



Tenho ouvido, lido e visto notícias sobre a prática sexual entre jovens de 12, 13 anos em banheiros e outros locais mais reclusos das escolas, e ainda a divulgação das práticas por filmagem exposta na internet. Temos de considerar:


-até que ponto essa nova ‘moda’ é expressão de transgressão, rebeldia, quebra de limites por parte desses jovens;


-o grau de influência da exposição midiática do corpo e da própria sexualidade, a banalização desses instintos, encarados não mais como sagrados ou pecaminosos, ou mesmo saudáveis, mas como produto de venda, e aqui coloco a publicidade no epicentro, por chegar aonde a pornografia não chega;


-seria talvez a força do amor pela exposição de si e de suas paixões, de seu ser ao mundo;


-superexposição da intimidade causada pela nossa sociedade, com o reinado das celebridades e o que as pessoas fazem para se comparar a esses novos ídolos, o que já denota um enfraquecimento de personalidade;


-distúrbios psicológicos, traumas causados por diversos motivos: clima familiar instável, personalidade problemática etc;


-a transvaloração ocorrendo inconscientemente, com a quebra das tábuas da moral e dos ditos ‘bons costumes’, um impulso de liberação sexual precoce tendendo a levar essa juventude a transpor limites e a se entregar cada vez mais ao outro, ou mesmo a se entregar mais para si e relegar a moral ao esquecimento. Essa última hipótese me parece improvável pelos seguintes motivos:


1-essas crianças, por mais rebeldes que pareçam ser, tem consciência dessa moral, apenas a ignoram sem se preocuparem com as conseqüências, ou ignoram a libertinagem como pecado.


2-a despreocupação com o prazer sexual, mais movidos pela cultura do exibicionismo e pela ridicularia da moralidade que por uma transvaloração. Os valores, aliás, parecem os mesmos, apenas são desrespeitados, o ideal não vale nada, é como se não existisse.


-aqui talvez uma variação, o prazer é buscado por ele mesmo, e o exibicionismo é parte desse prazer, logo, as considerações morais, psicológicas, midiáticas têm sua influência, mas ainda falamos aqui de um profundo despertar para dentro de si, um acordar para o corpo e uma morte para todo idealismo fora do prazer carnal, belo em si mesmo.


Desnecessário dizer que considero essas influências ditas externas participantes desse processo, mas ainda creio que essa nova loucura é bem mais interna, íntima, escondida nos véus da irresponsabilidade infantil, é ainda mais interna por ser infantil, ingênua. Aqui o apolíneo apenas esconde pela infantilidade das formas de agressão, de ruptura moral, um impulso verdadeiramente novo de busca pelo prazer, busca sem remorso, sem culpa, uma satisfação dos instintos mais profundos. Agora podemos analisar crianças mais velhas.


Anseios do homem de hoje

Considerando a falta de perspectiva do homem na pós-modernidade é de se espantar a longevidade das velhas ideologias político-econômicas e seus ridículos embates em arenas menos prosaicas, mais distantes de sua própria origem. Explicar tal fenômeno não é o objetivo dessa postagem, se é que ela tem algum objetivo. Falemos primeiro sobre o que desgasta nossa esperança, nossos anseios mais profudos e infantis.



Não há medo da morte que justifique, ou crise religiosa, ou mesmo a falta de fé nas ideologias, visto que a fé sempre existirá. O que me impede de criar uma igreja em meu nome e me chamar de Deus? Veracidade histórica? Mas não é a verdade que existe nas religiões, é a busca da verdade. Quando se quer buscar a Deus, vamos em uma igreja. Não vamos para encontrá-lo, vamos para buscá-lo, porque não é o estar-em-si que buscamos, mas o devir eterno, a mudança constante de sentimentos, ações, emoções, posturas e estruturas.

Por aí se vê que Deus pode ser considerado mera abstração de um ideal de perfeição, como já dito antes, a vontade humana impulsiona o ser para encontrar-se com o que sua alma crê ser seu reflexo. Como também já disse, a busca de Deus é pura busca do meu eu, não o fantasioso Eu Superior, mas o puro ego. Não vale a pena retomar esse ponto. Mas nele percebemos que a humanidade se satura de descobertas científicas, curas milagrosas, novas religiões e filosofias. Estamos no tempo do Caos.


O homem não mais procura o Cosmo, a ordem, ele deseja o devir, a inconstância, o pré-socratismo. Não lhe interessa mais a racionalidade, a moral abjeta, as visões bem-estruturadas, as cidades bem organizadas, os desejos de paz e felicidade. Ele deseja a dor, o sofrimento, a doença, a selvageria, a violência, o poder, a recusa de tudo que lhe alivia, mantém. ele quer pura e constante transformação caótica, ele deseja o oposto do que busca e só encontra pedaços fedidos de respostas.


Colocando em outras palavras, o homem pós-moderno não sofre de nenhuma falta de perspectiva. Mas suas esperanças estão no que nunca buscou, nunca quis. Ele não percebe, mas começa a sentir um comichão, uma pequena certeza de que não importa quantas luzes encontre, seu verdadeiro sol não é a lâmpada fosforescente nem o Deus sacramentado, mas o Sol de verdade, o brilho natural, a volta aos instintos anteriores, selvagens, belos e incontroláveis. Percebe que não é a ilusória e arrogante razão que o torna próximo do Perfeito, mas só é deus enquanto se tornar mais animal, mais irracional, mais selvagem. E, por isso mesmo, não se importa com o perfeito, o ideal, não mais!

Ele quer ser hedonista, quer ser livre, pensar sobre tudo e dominar, quer controlar e não tem vergonha de admitir, de dominar, matar e destruir. Pode se esconder por trás da ideologia burguesa, mas esta não o controla mais, foi derrubada, assim como a moral. Está morta como Deus está morto. A nova situação nada tem de desesperadora, de retrógrada ou capitalista. Nem a contra-ideologia comunista e a idealidade religiosa podem enxergá-la e lhe fazer frente.Trata-se de algo maior, mais profundo, um despertar para a vida, sem se importar com a nova aristocracia, a nova moral nobre, essa será consequência do seu salto. Esses tempos são os de preparação, de inspirar profundamente, tomar fôlego, dar um salto, um grande salto, o maior salto já dado para a liberdade.


Esses tempos já começaram, enquanto o salto não é dado, não nos entristecemos por saber que a humanidade não reconhece esse grande momento. Ele virá, já está vindo, aliás, e virá não por filosofia, ideologia, ciência, religião, virá naturalmente e grandiosamente, como uma onda que se avoluma prestes a engolir, a engolfar o mundo inteiro, suas ideologias e deuses perecerão. Permanecemos vigiando, que os ignorantes assim permaneçam, eles todos serão libertados, em um tempo que o prazer de viver será ainda maior, muito mais livre. Para os fortes, claro. Só no aguardo... até a hora derradeira, o Grande Meio-Dia.



Ecumenismo como armadilha

Peço que não me entenda mal, Deus meu, e todos os que lêem esses pensamentos. A liberdade de espírito só pode ser dom de Deus, em um sentido mais amplo que mero fruto do Espírito Santo (como se pudéssemos chamar de ‘mero’ qual seja o fruto), é na busca de Deus que se encontra a liberdade intelectual, não se trata de relativismo irresponsável ou mera fuga das exigências do meu caminho religioso esse abraço ao Todo religioso e filosófico.




A liberdade de que falei aqui nasce da busca da plenitude do Eu, se desenvolve a partir da visão, consideração, entendimento e até de certo aprofundamento das multiformes religiões e sistemas de pensamento e de cosmologia. Mas ela não nega, antes assume, até pressupõe uma tomada de consciência, uma visão crítica sobre a sociedade humana e suas maneiras de atingir essa plenitude espiritual através de um ideal. Ideal que considero a plenitude do meu Eu.


Com o processo de autoconhecimento, temos essa busca do meu ideal nas diversas sendas e nos seus diversos níveis. Com a ciência do Eu ideal, escolho uma forma de representação desse ideal, pode ser amplo, como o ecumenismo religioso até o mais estrito, um setor conservadoríssimo de uma Igreja particular, fechado em si mesmo. Seja qual for o meu nível de entrosamento, amor por esse nível, mais meu Eu se limita de acordo com a finitude dessa linha, pouco importando as promessas divinas de eternidade, imortalidade, vida que flui para o Tudo. Por outro lado, quanto mais amplo ele for, mais livre será o meu Ideal, será antes uma busca do auto-aperfeiçoar que uma mera escolha, mas escolha é um termo discutível.


O ecumenismo tem o defeito de relativizar pensamentos e crenças, tornando-os parte da grande revelação do Infinito para nós, que somos finitos e imperfeitos e não compreendemos o Verdadeiro desígnio do Perfeito, e, por isso, lhe damos interpretações mil. Seria essa a gênese da diversidade religiosa. Mas por que isso é um defeito? Sem Verdade Absoluta, não há um Eu ideal nem mesmo uma busca, há uma acédia de comprometimento, de procura, de vida. O conformismo que mata a minha própria noção de Eu, nem sei quem eu sou, já que não sei o que é o mundo ou Deus, perco minhas noções de Todo, já que Eu, Deus são universais, imutáveis, transcendem a matéria. Isso ocorre quando nego qualquer verdade maior, quando tudo é verdadeiro, na verdade digo que tanto faz a verdade, estou perdido em mim mesmo, no mundo e incapaz de dar respostas que me satisfaçam e, pior, nem buscar mais eu quero. Essa morte da religião tem várias formas, irreligião, ateísmo prático, agnosticismo.


O ecumenismo tem as melhores intenções, é sempre a liberdade que almeja, mas pode confundir o respeito pelo outro e mesmo uma saudável liberdade de espírito com uma indiferença mortal, que revela uma preguiça de espírito, de perseverança, uma preocupação materialista, utilitarista que são chagas da hodiernidade. Pensemos então sobre o desafio do verdadeiro ecumenismo: não alterar jamais as diferenças entre as religiões, nem mesmo atenuar as discrepâncias teológicas entre católicos e protestantes, por exemplo. O seu desafio é tornar possível uma verdadeira comunhão entre todos os cristãos e entre estes e os não-cristãos e ateus, contribuindo para promover a liberdade religiosa em sua totalidade, não se esquecendo jamais de sua missão de ajudar a comunidade humana a se desenvolver, e de forma sustentável.


Por isso a missão da Igreja é tão grave, por estar inserida em todo o mundo e sempre evangelizando, há de se discernir fundamentalmente em suas ações catequéticas e missionárias o respeito cultural e o verdadeiro espírito de fraternidade. Cultura que o cristianismo se propõe a desenvolver sem danificar, preservando o que há de bom e belo, e orientando sobre o que há de errado segundo sua ética do bem comum. Um paradoxo enorme para os cristãos de todo o mundo, para todos os crentes, e ainda maior para os espíritos livres.


Liberdade de espírito

A liberdade de espírito só é conquistada a muito custo, seja pela auto-destruição, pelo esmagamento próprio de si, sua cultura, valores, crenças, seja pelo confinamento desses elementos em um recanto escuro e sujo de nossa mente.



Ora, é então na segunda opção que realmente nos destruímos, nos violentamos, pois receber cultura-outrem apesar dos meus valores, ainda que escondidos, me remeterá a uma angústia tremenda, uma anulação verdadeira de si. De fato, esconder essas apreciações de um suposto Bem é como esconder instintos, é uma bomba-relógio, uma hora vai explodir. Ou pelo tempo que está reclusa ou pelo volume de paixões repelidas.


A destruição de valores próprios, por sua vez, não é uma violência, primeiro, por não doer, segundo por relegar ao nada o que pode me prejudicar, atrasar, afastar do meu objetivo, diminuir minha vontade, ainda que escondido. Não dói nada já que está enraizado na minha vontade o anular de minha cultura, não está em anular a mim mesmo. O que me anula? Negar meu Eu, e o meu Eu são meus valores, sejam eles políticos, religiosos, morais etc.

Não se pode nada desejar, nada querer, sonhar ou pensar, a não ser se falarmos aqui naquela auto-manipulação psicológica característica do esoterismo que consiste em alterar minha consciência, elevá-la a planos mais altos, chegar ao meu Eu Superior, que não sei se posso encarar como algo diferente de um sonho até pela minha ignorância sobre o assunto. Se é impossível, então toda anulação do Eu é fantasiosa, trata-se apenas, na vida da abnegação religiosa, por exemplo, de trocar meus ideais e vontades pelo que me é estranho. O que me é estranho eu torno próximo até absorver por minha vontade, a mesma vontade que nega a cultura antiga que eu abandonara, a mesma vontade que me torna eu mesmo, que é minha identidade, meu Eu.


Logo, é fantasiosa essa procura do fim de Si pela comunhão com Deus, consigo mesmo ou com qualquer deus ou entidade que seja um não-Eu. Essa ação é deliberada, é uma busca do fenômeno religioso, por ser busca é uma ação da minha vontade, faz parte do meu Eu mais profundo ou mais cínico e utilitarista. E durante? Busca inconsciente? Talvez, mas nem sempre. O budismo, então, não é uma mentira, é, na verdade, a superação da razão prática, do meu eu superficial que se preocupa com as chamadas ‘coisas do mundo’ para atingir o estado de iluminação, que seria como o mundo das Ideias de Platão ou algo próximo, o máximo que o homem chega do Inteligível, do Bom, do Belo em si, da coisa em si, como diria Kant. Pressupõe uma hierarquia de conhecimento da Verdade Absoluta, e um conhecimento das coisas práticas, das sombras, nos exercita para nos superarmos e chegarmos ao que a razão humana pode entender, mas só a muito custo, a muito disciplinamento do corpo. Aí temos a ideologia metafísica, moral e religiosa por excelência: ‘ o corpo é corruptível, logo é inferior á alma, que é eterna, assim o que é do corpo, as sensações e o mundo visível, visto ser apreendido pela visão e outros sentidos do corpo, é uma visão imperfeita de mundo. Só o que apreendo pela alma, que é incorruptível e perfeita, é verdadeiro, bom e belo em si mesmo, o resto é carnal, imperfeito. Da mesma forma, as paixões vêm dos sentidos, do que é mundano e o que é da alma, do espírito, é virtuoso. ’Moral grega que fundamenta sua política, ou vice-versa, e daí cria-se uma visão de mundo baseada nessa moral, nessa ideologia, que impregnaria o Ocidente por dois mil anos e não está de todo superada.


A elevação sobre a minha cultura é um vôo do meu Eu, uma superação dos meus valores. Para essa elevação ser mais que uma fantasia, um interesse bobo, uma curiosidade vã, uma ilusão, é necessário:


1-Conheça diversas formas de se pensar, de se conceber o mundo, não relativize as opiniões, mas as encare como formas diferentes de se ver a mesma verdade, seja ela qual for, mas sabendo que ela existe. Ou não.


2-É preciso ter uma grande vontade para voar acima de si mesmo, ter um Eu profundo. Isso significa ser livre de preconceitos, amores e ideais imutáveis, ter senso e intelecto para conhecer, analisar, criticar as ideologias vigentes e, ao mesmo tempo, conviver com elas sem se comprometer. É preciso ter intelecto para isso, mas é preciso ter uma vontade maior ainda, um sentimento de poder fazer, mudar, pensar. Depois vem a filosofia, primeiro o filosofar.


3-Os seus valores éticos, morais, religiosos, quais seja eles, devem não ser confinados, mas elevados em compreensão. Entenda o que você acredita e entenderá a si mesmo. O ‘conhece-te a ti mesmo’ nasce aqui, depois de conhecer o que outros acreditam dentro do grande projeto da vida, que pode ser visto como cosmo ou caos.


4-Não imponha o seu Eu a ninguém, nem a si mesmo, para que possa entender o outro em sua completude e seus valores e para não se prender em sua própria cultura, o que lhe seria cadeia de pensamento, reflexão, de conhecimento. Absorva tudo a seu redor, depois dissipe, guarde apenas na lembrança, nunca no coração. A pior prisão é o amor, o pior amor é o amor pelas idéias.


Só pra terminar, esse texto foi mais um desabafo, uma descrição do meu momento atual que uma guia, manual ou um catecismo para o espírito livre. Faça você o seu manual, nem creio que eu tenha autoridade alguma nem creio que qualquer poder nesse mundo possa lhe dizer o que pensar e fazer. O guia é a filosofia, o motor é o filosofar, mas tudo começa com o Eu e eu deixo isso como uma leitura interessante. Mas por favor não sou um doutrinador, sou contrário a esses vermes. Totalmente.

Bom dia e boas reflexões.


Revolução

Imagine você a tremenda descoberta de hoje: o mundo como vontade e representação! Não, não li o livro, nem tempo tenho. Mas ainda ssim, só uma passeada pelas folhas daquela revista com a matéria do Schopenhauer me fez refletir...


Durante anos, é-nos passada a idéia de sermos ou irrelevantes perante o mundo ou seus dominadores em potencial. Pouco difere disso, e é fato também que pouco questionamos graças à nossa porca consciência filosófica. Daí pra o narcisismo é um pulo. Ver uma filosofia tão limpa, tão polêmica, mas que vê no homem a base de tudo, ao mesmo tempo que lhe nega a prepotência de ser dono de coisa alguma.


Filósofo do pessimismo, talvez, mas o velho Schopenhauer conseguiu tocar meu coração, ou, como ele diria, é por minha vontade que aprecio seu pensamento.

Aliás, ele existe por minha vontade apenas, a vontade do homem em conhecer... fenomenal!


Política para vida

Convenhamos que a maior deficiência da humanidade está em admitir a própria concupisciência ou como o bom Maquiavel avaliaria, a sua incapacidade de viver socialmente. Eis aqui um bom paradoxo. Não é o homem um animal social?


Aristóteles nos define: "O homem é um animal político", sem contudo levar em conta a imoralidade das paixões sucessivas, incessantes e avassaladoras. Mas mesmo o discípulo de Platão concorda com o mestre, assim como este com Sócrates, que tal moralidade é a base da política. Tal conceito é grego demais para ser analisado friamente.


Agora vemos a insanidade da sociedade que questiona a crise ética, incapaz de perceber uma obviedade: o homem não se degenerou em um ser individualista por egoísmo, exacerbação de paixões ou por pura maldade. É assim que se vive no nosso mundo social e econômico, a nossa selva forma animais selvagens e os prepara, os condiciona a uma existência utilitarista. O que também não é novidade... Sendo assim, é possível falar de democracia hoje?



Introdução à razão pura

Desde tempos imemoriais, o homem vem tentando se firmar como animal racional, independente do próximo e de si mesmo. Sabemos, no entanto, que tal intenção é tanto irracional quanto impossível. De fato, qual o sentido desse blog?


Descrever as limitações e ilimitações do homem. Falarei muito sobre formas heterodoxas de religião, filosofias oficiais e outras não tão conhecidas, diversos assuntos envolvendo política e economia, além da análise da sociedade como um todo, especialmente a brasileira. Tendo esse objetivo em mente, creio poder iluminar certas cavernas, certas pessoas presas em seus mundos consumistas e idiotas. Auxílio espiritual? Nem tanto, proponho puro discurso filosófico...


Filosofia, esta nossa desconhecida. É uma pena mesmo...