terça-feira, 20 de abril de 2010

Santa ralé

Experimentar os arroubos mais rejuvenescentes, a felicidade mais inconstante e sadia, a concretitude da vida que escorre pelos dedos dos vorazes lobos, devoradores de sentimentos únicos e inimigos da vida em geral, tal é a exuberância que marca um mergulhar em si mesmo, uma profundidade maior, mais vivaz, que nos faz perceber o quanto a existência apodreceu, corroída por vermes religiosos.

Saber que nos tornamos tão enfadonhos, tão mendicantes, a ponto de  nos escorarmos em um ateísmo fraco, intelectualista, covarde, ainda pregando ética, paz e solidariedade é vergonhoso, quase humilhante. Ética? Que ética? A mesma moral de rebanho, mas em cores diferentes, com nova roupagem mas é o mesmo vírus! Paz? Que criação vigorosa, que poder, que glória já veio dos paraísos pacíficos, da idiotice conformista e pacificadora? O que há de mais odioso que a compaixão pelos fracos, a despudorícia dos magnânimos? Solidários como quem? Os vermes, a ralé da sarjeta fria e dura, os rebotalhos sa sociedade, e que sociedade! O que além de sonhos despudorados, deuses falsos, ideias torpes e doenças, maldições, sujeira e vergonha saiu da plebe? A quem aspirar lealdade? Lealdade? Ainda sabemos o que é isso?

Ai, irmãos meus, quanto sofremos pela miserável bondade dos padres e dos coxos profetas, anunciadores da morte, desprezando o que deveria ser o mais sagrado: nossos corpos e o sentido da terra! Como foste vil, crucificado! Pondo algemas nos seus rebanhos? Mas que mereciam eles? Não pediram pastor, mas sempre foram rebanho, lesmas grotescas e peças de um jogo nojento, tipicamente humano. O ódio das nações tem a ver com a vingança contra a maldade, vingança que nos ensinaste, ó nobre pastor. E há pastores nobres, não são todos da populaça? Mas a chandala é de um amargor furioso, de uma verdadeira sarna que impregna nos fortes...

Desisti, então, dos meus ardis, tomei sobre mim minhas dores e alcanei grandeza. Fraquejei e voltei aos celeiros, aos chiqueiros, mas os porcos me aborrecem. Sua doutrina é ranço, seu amor, teias de aranhas, e aranhas são eles, verdadeiras tarântulas, forçoso é serem ranço e lama, lixo e podridão, é dessa matéria que falam, que ensinam, que respiram e que amam! Amor? Há algo mais estranho às suas almas pútridas, pobres infelizes, algemados às suas tábuas antigas? Perdi esperança em vossa força, vós corroeis tudo que vive, sufocantes parasitas!