sábado, 6 de fevereiro de 2010

Ode à ciência histórica - parte 1

Admite-se a hipótese de a história ser uma das ciências de mais complexa evolução, e tem contra si os ódios dos diversos idealismos, e, por paradoxo simples, sua gênese enquanto ciência séria se dá com o materialismo histórico-dialético, a maior sandice idealista que o ser humano já concebeu, excluindo o abraamismo, óbvio. Temo, na verdade, mais pela ignorância desses paradoxos que movem a ciência que o desconhecimento em si da evolução, afinal, fazer uma história da história é tão trabalhoso como inútil. Nossos pseudo-filósofos podem bem dizê-lo...



A minha preocupação se deve ao meu espírito, que, antes de considerações religiosas e de qualquer existencialismo, sempre teve uma forte consciência histórica antes de ter uma consciência crítica. Comecei, digamos, pelo fim, mas a filosofia é mais uma curiosidade na minha vida, e um prazeroso exercício intelectual, uma verdadeira masturbação, digamos. A história, pelo ponto de vista marxista, por seu lado, sempre esteve presente na minha vida, e não creio que breves substituições de filosofias podem mudar isso algum dia. Principiemos a defesa do espírito histórico-crítico pela refutação do ideal cristão.


O cristianismo surgiu na minha vida através da filosofia, que já era, e sempre foi, masturbação intelectual, de Platão a Hegel, e, através dele, veio teologia, liturgia, história da Igreja. Conhecer o quanto os racionalistas anti-clericais deformaram a imagem da Igreja, ora, do cristianismo como um todo, me ajudou muito a endeusar Roma. As estruturas diabolicamente centralizadas, o aparato filosófico e a defesa da razão nos moldes helênicos a torna bem apreciável, mas, como conciliar esse monstro romano e digno dos louvores mais aristocrático, até imperial, com essa abnegação de todo sentimento de poder, esse poder construído sobre um castelo de piedade, bondade e fé?


Tentei me amolecer no monasticismo, nas obras sociais etc, mas Roma sempre será Roma, e os meus esforços de conciliar fé e razão, até pela filosofia da história da Civitate Dei, enfim, toda essas choradeiras me valeram escoriações de toda sorte e uma felicidade na ignorância, sem falar na defesa mórbida do medievalismo ratzingeriano. Ainda avaliando criticamente, essa posição dele é louvável pela coragem, e sempre admirei a coragem, ainda mais nesses tempos de atrofia monstruosa em nível moral, político-econômico e principalmente religioso-filosófico. Não há como não ver no ecumenismo e na Teologia da Libertação sintomas de uma degenerescência enorme dentro dos muros da Igreja, um infiltramento de ideologias na Cristandade e de sonhos globalizantes, aliás, a principal responsável por essa fraqueza. Tudo muito bem, tudo muito bonito, mas isso requer, ao mesmo tempo, uma idolatria de idéias absolutas, um descompromisso histórico ao afirmar a supremacia da vida do Nazareno sobre todos os acontecimentos do mundo e ainda crer em uma parúsia dita única, sendo que ela, como inúmeros elementos do cristianismo, existe em uma porrada de outros credos e pensamentos. Há inúmeras idolatrias idealistas que me comprometiam, a oração, por exemplo, tinha o mesmo efeito de uma viagem astral, o de me dar dor de cabeça e impotência sexual.


No mais, quando se derruba o idealismo, ficamos a ver navios e, o pior, é se ver emocionado hoje por celebrações litúrgicas, curas milagrosas, novas idolatrias e uma incapacidade de ver novos horizontes como se a pequenez cristã a tudo abarcasse por uma frase ou outra do Mestre. O fato é que a violência dessas dúvidas sobre a validade do cristianismo, alimentadas por um amor à coragem do Papa me impotencializa sobre novas opiniões sobre todo o resto, e não sei se isso é um bem, como um padrão verdadeiro, ou um mal, uma ilusão. Mas sem idealismo, o cristianismo ainda é útil antídoto contra o desânimo e o desespero, e um enfrentamento de realidades absurdas, além de proporcionar coragem e modelos a serem seguidos além da ascese. Hoje, estou tão assolado que nem sei mais em que acreditar e em que duvidar. Fico com a história.

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